Mortos vivos eram pragas comuns nos anos de escuridão. Vários deles eram encontrados nos grandes centros populacionais e foram os responsáveis por parte do extermínio da humanidade. Eles começaram a surgir pouco tempo depois dos ataques nucleares. Os carniceiros — como os caçadores os chamavam — eram pessoas normais que sofreram alguma mutação por conta da radiação. Especulava-se ainda que algum fator místico teria influenciado na concepção dessas monstruosidades.
A mordida deles era fatal e até os fluidos que eles expeliam pelo corpo, se entrassem em contato com a mucosa da vítima, resultava numa morte horrível. Durante o período de barbárie, quase ninguém sobrevivia ao ataque dos carniceiros, pois bastava um descuido, um pequeno erro ou uma distração para alguém ser contaminado. Liam havia testemunhando tal situação.
Dominique, um antigo companheiro de Liam treinado por Dimitri, levou apenas um pequeno arranhão desses monstros. Em poucas horas os sintomas começaram a aparecer. Ele passou dias agonizando com febre, convulsionou por uma noite inteira e perdeu a visão. Depois de 15 dias finalmente morreu. Durante os 5 anos de escuridão foi muito difícil lidar com essa praga. Mas quando o sol voltou a iluminar a superfície, os caçadores conseguiram dedetizar suas regiões.
Desde a partida da comitiva, nenhum caçador se deparou com os mortos vivos durante o percurso. Pensavam que todas morreram por falta de alimento ou qualquer outro fator ocasional do clima. Porém, Liam estava cercado por aquelas criaturas sem consciência. Um bando tão grande que chegava a ser inconcebível naqueles dias.
O caçador sabia que qualquer contato com aquelas monstruosidades poderia matá-lo facilmente, então ele correu o máximo que pode. Por mais numerosos e letais que fossem, os carniceiros só conseguiam se arrastar e caminhar com lentidão. Não passavam de amontoados de carne podre presa a ossos e ligamentos expostos. No entanto, eles eram vorazes, podiam procurar uma presa por dias e não precisavam de repouso.
A cada esquina mais carniceiros apareciam como se brotassem da neve. Ele se esgueirou tentando disfarçar seus rastros até conseguir abrigo numa escola no centro da cidade que era longe do galpão dos vampiros. Quando o caçador percebeu isso lhe ocorreu uma ideia.
Sem um segundo a perder, Liam correu novamente, usando as últimas reservas de forças do seu corpo. Ele chamou a atenção das criaturas que o perseguiram até o refúgio dos vampiros. “Vou usar esses desgraçados para cercar o galpão daqueles sanguessugas. Eu só preciso segurá-los lá por mais dois dias e eu terei a vantagem” pensou o caçador.
Durante o percurso ele percebeu o quanto estava cansado, seu cérebro parecia que se desligaria a qualquer momento, mas manteve a determinação. Com o galpão a vista e os carniceiros a uma distância segura, o caçador buscou um esconderijo provisório para repor suas forças antes de voltar para a escola.
Próximo da região, encontrou um sítio parcialmente soterrado de neve. Com muito custo Liam debloqueou a porta dos fundos e se arrastou alguns metros para dentro. Não teve energia para procurar uma acomodação nem fechar a porta pela qual tinha entrado, o caçador esgotado simplesmente tombou de exaustão.
Quando acordou, estava muito escuro, não era possível ver nada além do breu total. Liam tentou colocar o braço para trás em busca de uma lanterna na mochila, mas seu braço simplesmente não se mexia. O corpo estava dolorido e pesado, parecia que vestia uma armadura de chumbo com espinhos cravados nos músculos. O pouco movimento que conseguia fazer era com o pescoço. Liam fechou os olhos, tentou se concentrar para resgatar um pouco de sua força de vontade, mas foi interrompido pelo som de um isqueiro sendo aceso.
Ele arregalou os olhos no mesmo instante e tentou ver de onde vinha o som. Só esse pequeno movimento de reflexo foi o suficiente para a dor percorrer o seu corpo. Ele praguejou, fechou os olhos novamente, respirou fundo e tentou se mover com mais cuidado. Desta vez conseguiu olhar ao redor.
Num canto do cômodo, ele notou o brilho de uma chama tímida e bruxuleante. Uma menininha segurava o isqueiro. Ela parecia ter 10 anos, vestia roupas velhas de frio, o cabelo parecia desgrenhado e o rosto estava com algumas feridas. Não se parecia com os carniceiros e nem com os vampiros.
— Ele está aqui Donavan — ela disse.
Um frio percorreu a espinha de Liam e mesmo sabendo de suas condições ele tentou se virar para a direção que a menina olhava. Antes que tivesse a oportunidade, uma haste de ferro atravessou o ombro do caçador. Ele gritou e sentiu o seu sangue escorrer pelo casaco.
— Você conseguiu nos assustar mesmo — uma voz masculina grave soou atrás de Liam — Não se preocupe, logo você estará com o seu amiguinho.
Continua…
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